05/03/2015

Eu sonhei...


... em criar um núcleo de estudos do dharma em Faro. Vamos por partes. O que é o dharma? Basicamente, são os ensinamentos do Buda. 
Quem lê este blog há algum tempo sabe que eu descobri o budismo há alguns anos e identifico-me imenso com essa filosofia de vida. 
Quem lê o blog há algum tempo sabe que eu pratico meditação e sabe que eu gosto muito do monge budista Thich Nhat Hanh. 
Quem me conhece melhor sabe que uma das maiores fontes da minha felicidade é partilhar com outros o pouco que sei - seja sobre produtividade, gestão do tempo, minimalismo, yoga, ciência... 
Quem me conhece bem sabe o prazer, a honra e a gratidão que sinto quando leitores me enviam emails ou comentários a dizer que este blog mudou as suas vidas. 
O que ninguém sabe é que eu gostava de levar isto um pouco mais longe. Devagar, mas longe.

Uma das coisas de que sinto falta é de um grupo com quem possa meditar e analisar textos budistas. Esses grupos existem - mas não em Faro. Além da Sangha Flor de Amendoeira, na qual participo de vez em quando, não tenho mais contacto com outros entusiastas dos ensinamentos do Buda. 
E então pus-me a sonhar. 
Que bom que seria fazer parte de um núcleo de estudos do dharma, que se reunisse semanalmente para meditar um pouco e ler e discutir textos com uma chávena de chá quente... Um grupo onde pudéssemos aprender, ensinar, tirar dúvidas, debater, filosofar, meditar... Um grupo onde, durante uma ou duas horas semanais, pudéssemos voltar a nós próprios e viver em consciência plena.

Portanto, o que eu gostava de saber com isto, leitores da zona de Faro, é se alguém teria interesse em participar de um grupo de estudos do dharma (quem estiver mesmo, mesmo interessado, por favor envie-me um email ou msg pelo facebook). É isso.

E para terminar, fica aqui um texto de Thich Nhat Hanh - para ler e refletir. 

Porquê meditar?

A primeira coisa a fazer é parar qualquer outra coisa que esteja a fazer. Agora sente-se num lugar confortável. Qualquer lugar está bom. Observe a sua respiração. Ao inspirar, esteja ciente de que está inspirando. Ao expirar, perceba que está expirando.

Muitos de nós passam muito tempo sentados, muito tempo. Sentamo-nos nos nossos trabalhos, nos nossos computadores e nos nossos carros. Sentar-se neste contexto significa sentar-se de uma maneira que goste, sentar-se de forma descontraída, com a mente acordada, calma e clara. Isto é o que chamamos de sentar e é necessário algum treino e prática.

Na nossa vida diária, a nossa atenção dispersa-se. O nosso corpo está num lugar, a nossa respiração é ignorada e nossa mente divaga. Assim que prestamos atenção à nossa respiração, enquanto inspiramos, estas três coisas, o corpo, respiração e mente se unem. Isso pode acontecer em apenas um ou dois segundos. Você volta para si mesmo, sua consciência une esses três elementos e você torna-se totalmente presente no aqui e agora. Você está a cuidar do seu corpo, você está a cuidar da sua respiração e você está a cuidar da sua mente.

Quando faz uma sopa, tem que juntar todos os ingredientes certos em harmonia e deixá-los ferver. A nossa respiração é o caldo que une os diferentes elementos. Nós unimos espírito e mente através da nossa respiração e eles integram-se, assim são uma coisa só. Nós somos um todo. Não precisamos controlar o nosso corpo, mente e respiração, podemos apenas estar presentes para eles. Nós permitimos que eles sejam eles mesmos. Esta é a não-violência.

A energia da consciência plena pode ajudar a melhorar todo o seu ser. Basta prestar atenção à sua respiração. Permita que ela seja como é e vai ver que a qualidade da sua respiração torna-se naturalmente mais calma, mais profunda e mais harmoniosa por si só. Este é o poder do reconhecimento simples. Quando a respiração for mais profunda e mais pacífica, terá uma influência imediata no seu corpo e na sua mente. Paz e tranquilidade são contagiosas.

Imagine um barco cheio de pessoas que atravessam o oceano. O barco é apanhado numa tempestade. Se alguém entra em pânico e age precipitadamente, vai colocar em risco o barco. Mas se há pelo menos uma pessoa que está calma, esta pessoa pode inspirar calma nos outros. Tal pessoa pode salvar todo o barco. Esse é o poder da não-ação. A nossa qualidade de ser é o fundamento de todas as ações adequadas. Quando olhamos de perto as nossas ações e as ações daqueles que nos cercam, podemos ver a qualidade do ser por detrás dessas ações.

Imagine árvores de pé juntas numa floresta. Elas não falam, mas sentem a presença umas das outras. Quando olha para elas, poderia dizer que não estão fazendo nada. Mas elas estão a crescer e a fornecer ar limpo para os seres vivos respirarem. Em vez de descrever a meditação sentada como a prática da concentração, de olhar profundamente, e ter insight, gosto de descrevê-la como desfrutar de estar sentado sem fazer nada. Principalmente, sentar é desfrutar do prazer de sentar, estar totalmente vivo e em contato com as maravilhas do nosso corpo, o ar fresco, os sons de pessoas e aves e a mudança de cores no céu.

O termo para se sentar e estar consciente é meditação sentada. "Zen" é a pronúncia japonesa de Dhyana, que é a palavra sânscrita para meditação. Meditação é simplesmente a prática de parar e olhar em profundidade. Você não de se sentar para meditar. Quando olha profundamente, seja se estiver andando, cortando legumes, escovando os dentes ou indo à casa de banho, você pode estar a meditar. A fim de olhar profundamente, você precisa ter tempo para parar tudo e ver o que está presente.

Com plena consciência e concentração você pode direcionar a sua atenção para o que está presente e ter um olhar profundo. Você pode começar a ver a verdadeira natureza do que está à sua frente. O que está presente pode ser uma nuvem, um seixo ou um ser humano. Pode ser a nossa raiva. Ou pode ser o nosso próprio corpo e sua natureza impermanente. Todas as vezes que nós realmente paramos e olhamos profundamente, o resultado é uma melhor compreensão da verdadeira natureza do que está presente dentro de nós e ao nosso redor.

Quando as pessoas dizem: "Não basta sentar, faça alguma coisa," eles estão pedindo-lhe para agir. Mas, se a qualidade do seu ser é pobre, se você não tem suficiente paz, compreensão e equanimidade, se você ainda tem muita raiva e preocupações, as suas ações irão também ser pobres. As suas ações devem basear-se na fundação de um ser de alta qualidade. Ser é a não-ação, por isso a qualidade da ação depende da qualidade de não-ação. Não-ação já é alguma coisa.

Há pessoas que não parecem fazer muito, mas a sua presença é fundamental para o bem-estar do mundo. Você pode conhecer pessoas como estas, que são estáveis, nem sempre ocupadas fazendo as coisas, não ganhando muito dinheiro ou envolvidas numa série de projetos, mas que são muito importantes para si; a qualidade da presença delas torna-as verdadeiramente disponíveis. Elas estão contribuindo com não-ação, pela alta qualidade de sua presença. Estar no aqui e no agora, sólido e totalmente vivo, é uma contribuição muito positiva para a nossa situação coletiva.

Muitos de nós continuam a tentar fazer mais e mais. Nós fazemos as coisas porque achamos que precisamos, porque queremos ganhar dinheiro, realizar algo, cuidar dos outros ou queremos tornar as nossas vidas e o nosso mundo melhores. Muitas vezes fazemos as coisas sem pensar, seja porque temos o hábito de fazê-las, porque alguém nos pede ou porque achamos que deveríamos. Mas se a fundação do nosso ser não for forte o suficiente, então quanto mais fizermos, mais perturbada a nossa sociedade se tornará.

Às vezes fazemos muito, mas nós realmente não fazemos nada. Há muitas pessoas que trabalham muito. Há pessoas que parecem meditar muito, gastando muitas horas por dia fazendo meditação sentada, cantando, recitando, acendendo uma grande quantidade de incenso, mas que nunca transformam a sua raiva, frustração e ciúmes. Isso ocorre porque a qualidade do nosso ser é a base de todas as nossas ações. Com a intenção de realizar, julgar, ou agarrar, todas as nossas ações, mesmo a nossa meditação, terão esta qualidade. A qualidade da nossa presença é o elemento mais positivo que podemos contribuir para o mundo.

Quando se sentar, a primeira coisa a fazer é tornar-se consciente da sua respiração. Tornar-se consciente da sua respiração é o primeiro passo para cuidar de si mesmo. Ao se tornar consciente da sua inspiração e expiração, você pode ver como a sua respiração se move através do seu corpo. Você começa a tomar conta do seu corpo e da sua mente, e começa a encontrar alegria no simples ato de respirar. Cada inspiração pode trazer alegria; cada expiração pode trazer calma e relaxamento. Esta é uma razão boa o suficiente para se sentar. Nós não precisamos de nos sentar com a intenção de nos tornarmos mais espertos ou iluminados. Nós podemos sentar-nos para desfrutarmos apenas de estar sentados e estar a respirar.

Se perguntar a uma criança: "Porque é que estás a comer chocolate?”, a criança provavelmente vai responder "Porque gosto." Não há propósito em comer o chocolate. Suponha que sobe a um morro e permanece no alto para olhar em redor. Pode senti-ser muito feliz em pé sobre o morro. Não há uma razão para fazer isso. Sente-se, a fim de se sentar. Fique em pé a fim de ficar em pé. Não há nenhuma meta ou objetivo em sentar-se. Faça porque isso o faz feliz.

Fonte: “How to sit “– Thich Nhat Hanh
Texto retirado daqui, ligeiramente alterado para português de Portugal.
Versão pdf aqui.


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9 comentários:

  1. Adorava se fosse em Lisboa :)

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  2. Bom seria se fosse em Lisboa :))

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  3. Rita, para mim, bom mesmo seria se você viesse ao Brasil! Rsrsrsrs!
    Tenho de dizer que seu blog realmente mudou a minha vida, e eu nem sei como agradecer. Muito obrigada, de coração!

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  4. Mesmo que, de momento, não possa participar, (moro no Porto), OBRIGADA, Rita.
    A minha vida tornou-se mais plena por te "conhecer".
    Um abraço do Porto
    Sao

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  5. Olá Rita. Já a sigo há algum tempo. Frequentei consigo um workshop de introdução à meditação no espaço himalaias. Sou de Faro e interesso-me por budismo. Gostava de a ajudar nesse sonho pois também o tenho.
    São.

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  6. Sabe sempre bem ler um texto assim. Eu interesso-me pelo budismo. Umas vezes leio, outras pratico, mas outras distancio-me... Volta e meia aparece alguém que me relembra o quanto é bom estar ligada. Obrigada. Quando vivia em Portugal seguia um grupo no Porto de práticas tibetanas, meditações semanais, yoga tibetano, sessões de taças tibetanas... tenho saudades. Acho que fazes bem em criar um grupo assim. Por mais que nesses grupos as pessoas venham e depois possam desaparecer e desistir, algo fica, algo é precioso e vale sempre a pena o esforço. Força nesse projecto :)

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  7. olá Rita - como todos os teus projetos este é muito interessante. infelizmente vivo no Estoril e também ando à procura dum grupo aqui perto. muito sucesso nessa iniciativa. o teu blog tem sido um grande apoio para mim. obrigado

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  8. Agradeço muito a partilha destes temas. O Budismo ajudou-me a encontrar a PAZ que eu nunca havia antes sentido em minha vida. Se eu não morasse tão longe (sul do Brasil) adoraria fazer parte do teu grupo !!
    Ana Carolina

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  9. Parabens pelo blog.
    Penso que o mundo seria um mundo melhor se pusermos em pratica no nosso dia a dia os ensinamentos de Buddha fico feliz por saber que cada vez mais conhecendo filosofia Budista.
    Bjs
    Mafaldinha

    de Lisboa

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